sexta-feira, 10 de maio de 2013

Parede


Agulhas investigando na carne
procurando o coração lilás dos corpos
coisas que têm nome
e são leves como penínsulas.
Desarrumam-se as aparições
nas molduras de ouro,
formas que se furtam ao dedo
e carregam o odor visceral do sonho.
Na parede grita o coração da parede...
Corpos com estátuas dentro,
esticando o braço ao horizonte
- o ébrio braço, o horizonte –
procurando os bandos de aves marinhas
que são povos derrotados em terra
leves, agora, como folhas, deslizam sobre o vinho.
Do vinho ficou o nome
e a caixa de madeira para guardar os ossos
quando já não servem para marcar os quadrantes.
O longo pescoço das flores, as fogueiras
a lâmina quente cortando a cara
pelas rugas.
Subestimaste os anos e as estações
deitaste na cama o rumor das bússolas
- os torneados corpos das bússolas –
Subestimaste o norte, o leme e a voz...

A carne rija das paredes
frias, como o nome das coisas que são frias
fala devagar misturando dialectos
explicando a evolução das cores
das mais quentes para as outras
e justificando a monstruosa textura da cara
quando pronta a morrer
A casa está vazia. Mas há uma voz.
Há um canto maior, um batimento
uma vibração cíclica
...talvez uma palavra repetida até ser água.
Procuro-te.
Escavo com agulhas a parede
até ao osso, até à estátua.
Procuro-te.
Procuro-te...
                                                                                                                                                                                        nm-v