-Eu
sou o teu filho, o teu pecado. Sou a tua timidez.
E
a mãe recebia-o nos braços magrinhos.
Não
era seu filho.
-Eu
sou o teu filho, o teu medo.
Sou
o teu olhar novo sobre o mundo. Eu sou o mundo.
Ele
não era o mundo, ela recebia-o.
Concedia-lhe
o peito. Amamentava-o.
-Eu
sou o teu filho, a tua carne nova ardendo no forno.
Eu
sou o teu fogo.
Ele
não ardia, ela recebia-o.
Mudava-lhe
a fralda. Aquecia-o.
-Eu
sou o teu filho. O teu predicado.
A
tua palavra feita carne.
Ela
recebia-o. Cantava até que adormecesse.
-Eu
sou o teu filho. A tua continuada esperança.
Sou
a fé no branco dos teus olhos.
Ela
recebia-o. Tapava-o com os cobertores. Velava-o.
-Eu
sou o teu filho, a tua salvação.
Sou
a tua carne extrema.
Ela
recebia-o. Tratava-lhe das feridas. Salvava-o.
-Eu
sou o teu filho, as tuas mãos futuras.
Eu
sou a tua memória.
Ela
recebia-o. Lavava-o. Dava-lhe a sopa à boca.
-Eu
sou o teu filho, o sangue novo da tua loucura.
Eu
sou a tua loucura nova. Sou a cura.
Ela
recebia-o. A mãe longa e densa abria-lhe a porta.
Emocionava-se.
-Eu
sou o teu filho. Sou o ferro vertido pelo teu peito duro.
Sou
a fundição. Eu, mãe, sou o teu pai!
-E
eu serei a tua filha. E recebia-o.
Ensinava-lhe
a tabuada e os planetas…
Nuno Mangas-Viegas
(Tavira, 29 de Janeiro de 2014)
[Editado a 25 de Maio de
2014]