quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Sigo meio-vivo

Sigo meio-vivo,
balanço na desilusão.
Sinto o prurido,
vejo o meus olhos, irados
[traídos pelos sentidos]

São induzidos em erro
[e choram a histamina.
Combatem a substância da falha.]

Para lá do azul...quem és?

Para lá do azul repousei os meus olhos
Deitei os cabelos em novelos de nuvem
Abri o meu corpo em searas de filhos
Adormeci na sombra de amplas copas
Não acordei sacudida de chuva
Não ardi na fornalha de oblíquos raios
Molhei apenas a minha alma nos orvalhos
Gotículas de papoilas e outras pétalas
Recolhi-me em ninhos de cegonhas
Cantei nas asas melódicas dos gaios
A minha flor de Maio ficou púrpura
Ao olhar o mundo revi-me vezes sem conta
E a usura da vida remoeu-me o peito
Quantas vezes quis eu dormir ao relento
Em planícies em estrelas abertas de noites frias
Para aquecer o nascer do sol num grito
Arqueando as costas num gesto aflito
De quem não sabe ter prazer senão todos os dias
Numa exigência inegociável de sorrisos
De abraços e desejos lidos no vento
Assobiados nas cantigas de amor e tédio
Searas inteiras de Alentejos perdidos
E eu a ler as linhas do meu corpo como um mapa
Para chegar a mim como botão de campainha
E responder-me : quem és?

Quase

 

Noite
Quase
Atravesso
É do outro lado
Deste lado adormeceu
Acordo-me nos ruídos
O Sol esperguiça-se.
Noite
Quase
E pensar que hoje foi manhã
E amanhã será noite
Outra vez

d'água

goteja
sobre a testa franzida
escorre suor
pinga do nariz bate na rocha
chove
sobre a sombra dissolvida
água vem água vai
e ninguém se deixa calar
o silêncio
verte-se sobre a mesa
e cuspindo sobre a mesma
borram-se as letras
e fundem-se gestos