terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Existe mesmo um rumo?
Faz diferença a nossa forma de existir?
Importa o carácter?
Vale a pena lutar?
Valerá a pena planear uma conduta acertiva?
Construir ideais?
O que a pessoa é, conta?
É pessoal, ou aleatório?
As coisas são assim e pronto, ou são ladeadas de calçada?
Vão elas mudar?
Vamos mudá-las?
Vão elas mudarnos?
O caminho vai-se construindo, ou já está lacrado desde o começo?
Comtemplaremos um fim?
Ou o fim é simplesmente a ausência de um final?

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

poema de comboio #10

som. As palavras era feitas apenas de som
e sabíamos tudo o que era preciso para sobreviver(...)

poema de comboio #9

mas a volta
a volta que implica o movimento
o passo que implica a paragem
o esforço que implica a volta

mas a volta
o movimento que a volta implica
o passo que a volta complica
a vida que há numa volta

mas a vida
a vida que a volta compreende
a morte que a ela se estende
a volta que leva a vida

mas a morte
a vida que a ela se oferece
a volta que leva essa prece
o esforço que eleva a morte

poema de comboio #8

antes de mais gostava de te dizer
que nenhuma ortografia no mundo te pode ajudar nessa tarefa

não como fazer disto um anúncio
ou clamar a injustiça aos ventos que não entendem a tua fala

antes de menos gostava de não falar
não há nenhum som do mundo que o possa exprimir

não completamente
não sei faltar algo
não sei ser mais nada

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

poema de comboio #2


activei o sonho diário nas conchas que esperam o sol entre o fim do caminho de terra e o meio do centro de emprego da tua zona predilecta
abc calculado nas raias da nuvem sonhada – mais que um abc, um abcd de absolutamente nada – as regras do nada para o tudo onde poderemos dizer ‘ya’ sem que ninguém não olhe de lado
tantos lugares minha senhora e mesmo assim teria de ser ao meu lado onde os rabiscos escritos no banco não são azuis mas sim cor-de-nada
lá fora a paisagem cá dentro o murmúrio da máquina e das gentes caladas pelo ‘punk rock’ quase progressivo que me grita nos ouvidos
está activo o sonho e está no lugar da frente no lugar em frente ao meu no lugar defronte ao nosso e tu esperas pela próxima linha como quem chama sem som como quem soa a silêncio e silencia o comboio

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

poema de comboio #1


um olho no carro
uma porta de dentes
cerrados caminhos
sem lados diferentes
Tatuagem de pano
na boca fechada
sentado num cano
largura alcançada
Descanso no topo
um gel de esperança
na teia da aranha
sem formas na anca
um’âncora no peito
preso à nova poesia
pois fecho as portas
nas noites sem dia

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

lá fora
os olhos são cor de sol
porque a água tarda em cair
e quando cai
é já tarde
demais
lá fora


domingo, 29 de julho de 2012

diário

imensidão

foge. foge que eu já não sei se me lembro como correr

o vazio

corre. corre porque a fuga é um regresso, dizem

queimadura

'antes de ontem, anteontem, amanhã, depois de amanhã'
chegas à hora que sempre espero que chegues
como as primeiras gotas de chuva e o cheiro que fica do chão

mensagens

vamos. vamos porque acabamos sempre por encontrar tudo
quando fugimos.

fotografia

correr. correr até as pernas ficarem de pé

ponto final

. 'porque o ontem estará sempre agendado para amanhã. amanhã lembrar-te-ás como será hoje'

. imensidão

é tudo tão relativo e tão nosso todos os dias

escolha

qual?

terça-feira, 3 de julho de 2012

Um dia...


As paredes cantam a chuva,
as calçadas sabem a vento.
Caminharei, como quem caminharia de verdade,
- fendendo passo após passo -
numa morada tardiamente próxima.
Vieste de costas cheirando a lágrima
Mas teus olhos, cerrados,
não gritaram a rusga da manhã
e o sol por que esperavas
não soube ficar, untando os telhados
dessa memória que me trouxeste
um dia antes desse tempo chegar…

Um dia seremos chuva e já não haverão palavras...
Um dia, esquecer-me-ás.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

a simplicidade dos olhos
a complicação das palavras
a natureza dos sons
a artificialidade da escrita
a morte da vida
a incapacidade de ser capaz
a noção do tudo frente ao nada
a imobilidade
a dor
a impossibilidade de falar
a incapacidade de ouvir
a determinação
a fuga
a vontade
a rusga
a fome de saber
a artificialidade do saber
a morte do saber
a noção do saber
a força
a forca
a fisga
a rusga feita com uma fisga
a rusga que provoca a morte apenas com uma fisga
a vontade de fazer uma rusga a quem nos rusga com uma fisga
a artificialidade da vontade de fazer uma rusga
a vontade de fugir artificialmente
a fuga aritifical
a dor

terça-feira, 15 de maio de 2012


A lenta combustão da manhã…


despertar sobre extintos quartos
numa planície abandonada por deuses e chuvas,
paisagens tombadas sobre o grito que alguém
uivou perante os silêncios erguidos no mar
e em terra cristalizados nos interstícios de sonhos
de extintos dedos sobre velas ainda acordadas.
Há uma canção ardendo a meus pés
e lençóis bailando na ausência de ar
interno, nesses estranhíssimos quartos de vidro…
Transformar a irrealidade em milagre
e o fogo em coisa amada
colora de ondas o braço rudimentar
de uma carícia violenta,
tinge de espasmo a mão fechada
que deslumbra a eternidade
no ínfimo gesto de se manter inalterável.
Dormindo e acordando se restabelecem fôlegos
colhidos em bocas caladas que se beijam
- que se anulam em vectores de línguas -
e em pálpebras branquíssimas
esmagadas por um pecado primeiro
edificado a extremos e cravado a profundidades impossíveis.
Há um quarto onde despertas em chamas
e há as chamas que a mim me despertam…
um mar que se ergue nos lençóis
que traíste …
E há um bilhete no chão, escrito com a tua letra,
e nele um grito sem ar descuidado na pontuação….

Provavelmente será teu o branco incêndio…
…ou talvez a memória dessas impossíveis pálpebras…

Número 2 da Revista

https://sites.google.com/site/daequum/home/numero-2-maio-junho-2012

Pessoal, estou a compor o 2º da revista D'AEQUUM,

preciso de fotos, sugestões gráficas e sempre TEXTOS vossos e de amig@s vossos.

Saudações,

j

"as pautas têm tudo menos o mais importante!"

sentado, naquela posição que vem adquirindo, torto mas confortável.
saboreia um gole de café solúvel, diliuído em água e receios.
pousa as folhas no chão, cheias de colcheias e apogiaturas que não entende.
compassos compostos, marcados a três, que lê, um de cada vez.
ligaduras que fazem a prolongação de um mundo para outro, e que acabam num acorde diminuto, difícil de explicar.
assim como todo o seu ser, que choca em todas as tonalidades e segue de cromatismo em cromatismo.
há-de haver um ponto de repouso, uma suspensão , um uníssono, ou uma simples reverberação.
evitar repetir as quintas paralelas, assim como os mesmos erros, ainda que em oitavas diferentes.
o metrónomo da vida marca-lhe um andamento lento, pesado, com acentuação nos tempos fracos.,
mas ainda com escalas por construir e arpejos por desvendar.
e no meio das cordas, perdido nos trastes, vê nas folhas de outros a vida que quer.
folhas que são mais do que músicas, são pedaços de vida, sempre com uma vida nova.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Para além do invisível

Não sei quantas camadas de pele tens, quantas barreiras tens àquilo que te conheço, apenas sei que as dificuldades em ti me são fáceis. Raramente falamos de alguém para além do que conhecemos a partir da sua imagem, da sua pele, e tudo o que dela possamos dizer é efémero, como efémero é o conhecimento que dela temos. Nada nos engana mais do que a imagem que temos de determinada coisa, a não ser que sejamos a própria imagem. Não sei até que ponto é possível sermos nós os sintonizadores da imagem dos outros, nem sequer se alguma vez o chegaremos a ser, mas sei que ultrapassei todas as camadas de pele que te protegem e agora entrei-te. Habito-te um ponto a que mais ninguém ousou chegar, como um daqueles locais ermos e húmidos que as florestas tão bem guardam. Sei de todas as árvores e conheço bem os ramos que lhes crescem, assim como os cheiros molhados que me sufocam o prazer. Não sei quantas camadas de pele tens, quantas barreiras tive de ultrapassar, mas sou quem sonha e vive cada ponto para além do que te conhecem.

sábado, 7 de abril de 2012

Tempos

Não me servem de nada os tempos mortos.
Não falo. Não escrevo. Não vivo.
E, das duas uma, ou não sou eu, ou sou-o no estado mais intimo.
Abandonado de qualquer coerência deambulo entre a calma e a agitação, a angustia e o sossego.
Meu cérebro, cheio de vontade própria, cansa meus olhos, que doridos berram água e sal.
E coordenados como bailarinas, rodopiam em ternário.
Fecham, abrem, e mesmo sem luz alcançam várias cores, cores vivas.
Rendido à sua presença partilho a almofada com a insónia.
E permaneço ali, preso, mas um ser irrequieto e contemplador de um cenário negro com riscos de vivas cores.

quarta-feira, 28 de março de 2012

o elo mais fraco canta a merda do hino
o português mais forte é ainda o salazar
e os filhos da puta dos velhos que ainda o chamam
que ainda pedem que ele venha limpar o lixo
formam a escumalha que de lá restou
quem não levou nos cornos, a quem não cortaram
os dedos com limas, a quem não privaram de
água e comida, a quem não ficou na solitária
acompanhado das suas fezes. arranca paísinho

quinta-feira, 22 de março de 2012

...poema preto e vermelho...

...não é com tinta mas com o meu sangue que escrevo...
...foram dois corvos que anunciaram a tua chegada...
...começou, quão delirante mergulho em queda livre e vertiginosa...
...prenúncio de morte num beijo...

...o êxtase da luxúria das palavras vermelhas era sangue que jorrava de nós...
...rompíamos os pulsos no maior delírio de um poema...
...apenas porque o champanhe do teu corpo nos elevava para lá dos nossos, nas bolhinhas de gás de um vulcão qualquer longe de nós, noutro país, noutras palavras...

...o corvo arrastava uma asa torta, era a morte a bater à porta da morte...
...sabíamo-nos definhar lentamente com ela, aniquilávamo-nos no movimento orgiástico dos corpos e riamo-nos disso...

...talvez que nem tivéssemos existido para lá de uma gargalhada...
...mortos à nascença de nós...
...e tivéssemos vivido apenas na impossibilidade de viver...
...doce demência: a ilusão....
...espingardas e pistolas de água, bandeirinhas brancas, o sorriso dos cavalos!...
...alguém ao fundo gritava alegria e toda a gente compreendia...

...era noite, era dia, era outro tempo qualquer...
...outra luz qualquer, uma abstração cor de mel...

...os olhos ardiam e os dentes rangiam...
...trovoada de meio dia... ...canja de letras... ...campa de letras...
...no fundo do pote trazias água escondida de ti...
...bebia da água enquanto os corvos cravavam os bicos no meu estômago... ...mesmo assim bebia-a, entornava-a sobre mim no maior festim carnal...
...era quente, era fria, era vinho, era água...
...da fonte entornavam-se palavras, saíam das veias do corpo desunido, sacudido por cães esfomeados, esventrado por lobos azuis...
...rompiam a carne da cabeça para baixo... ...fiquei com azia de escrever!...

...ventos fortes arrastavam-me para longe...
...era noite, era dia, animal acordado e solto na floresta sem floresta de mim... ...deserto acutilante de feras e pedras roxas...
...precipícios abissais na rosa dos quatro ventos...
...sopros de pássaros pretos à janela: o meu amor chegou!...
...cheguei de manhã e não haviam ovos mexidos...

quarta-feira, 21 de março de 2012

eu sei quem tu és
as ondas trouxeram-me o sol
o suficiente para te ver
e para agendar novo encontro

na folha estão as coordenadas
e tu corres em busca de asas
para aterrar do teu sonho
em terra

são as letras que te afeiçoam
é a face que apregoa a retórica
e guardas no bolso a imagem que máquina não sabe capturar
capturas-em com esse delinear frouxo
a cor negra da tinta que vamos respirando

em tempos, em infinidade, eu escrevi tudo isto
e mais escreveria se quisessem as folhas
desfolho-te, desfolhas-me, e as palavras não me deixam
nem te deixarei calar nunca
porquanto tiver o sol que me deixa ver quem sou
e a chuva onde a vida não reclama
eu poderei ler-te
ler-vos
e marcar tertúlia
das almas
para outros dias
vindouros.

um afecto enorme que eu sinto
e que não deixo nunca, não como deixaria a carteira em tua casa
ou outro objecto do meu esquecimento

eu sei quem TU és
e TU sabes quem SOMOS
porque te LÊS
porque NOS lemos
e não nos esquecemos ainda
de como se escreve

Saúdo-vos irmãos/ãs
a vida começa ontem
a poesia morreu amanhã
e nós estamos no meio

O aprendiz de poeta

Escrevo a palavra “poesia” numa rocha e lanço-a ao mar.
Afunda-se.

- A poesia vai ao fundo quando agarrada a uma rocha –

Tudo o mar engole,
Tudo o mar sacia.
Decido recuperar a rocha,
não é sítio para se guardar a poesia.
Mergulho nas agitadas águas…
…encontro-a.

À superfície, observo que a palavra se apagara
- A poesia dilui-se na água –

Fitei, alegre, o horizonte pelágico,
O mar é agora o poema…

sábado, 17 de março de 2012

-_-_-_-

Dir-te-ei nada. Saberás de mim zero.
Tenho a casa do avesso. Sou impaciente.
Sou intolerante e rabugento.
Não sou invisual, e nem por isso vejo muito mais que nada.
Porque não há reacções, porque não vejo vontade.
Não vou incentivar, quero uma atitude genuína.
As palavras já as gastei, sem resultado.
Assim fico som sono, confuso, com pena.

terça-feira, 13 de março de 2012

onde um dia quisesses ir... não vás

as palavras podem sempre ser cuspidas contra a tua cara
sem o calor, nem a chuva, nem a vontade
nem os olhos, nem o que oiço, nem o que gritas

as ordens não são infalíveis,
nem o salário, nem o patrão
nem os olhos, nem os punhos, nem a bandeira

concordo em quebrar as linhas
sem calor, sem chuva, sem saudade
abrir os olhos, os ouvidos e a ver se agitas

as palavras podem sempre ser corrompidas
sem a vontade, sem o salário,
sem os punhos, sem a bandeira, no fundo
nada disso vale quando chega a tua vez de ser enganado.

domingo, 11 de março de 2012

quinta-feira, 8 de março de 2012

e depois tu vieste @ Cáceres Fev/2011



Porque a tristeza se quer triste

e tu nunca me mentiste

porque a dor se quer feita de harmonia suficiente

e depois, tu vieste


dói-me ser dor e triste emoção
pedra de afiar as facas que me corta o coração


e tu nunca o permitiste

Porque a alegria se quis antes

e tu vieste mesmo
porque a dor se quer longe, afinal, mas nada se almeja

dói-me ser
pedra rugosa do passar de um espaço a outro

e depois, tu vieste

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

pOEMAvIDA @2


olhava no chão sem o saber
cismava a teimosia da força
desafiando toda a gravidade de um gesto
contra o peso.

pesado, encontrou a motivação
alienando o resto, unindo tudo à sua volta, de vez
com as mãos segurava o Mundo
com o Sol brilhava os pés

e, sem temer o movimento,
desconhecendo todas as regras da física
explodiu com o avançar no chão da sala onde antes rastejava

daí surtiu-se o chuto
a força para afastar e mover o intento
e aliou a vontade à capacidade de se mexer

olhava o chão
agora passando mais rápido pelo canto dos olhos
sem saber que um dia ainda o veria passar mais rápido.


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

um dia o hélder ia começar um poema assim

Posso ter os meus dias de lareira brilhante


(verso encontrado nos rascunhos do blogue, desculpa hélder teve de ser)

pOEMAvIDA @ 1


nasceu o conceito do nascimento;
o fogo cresceu para o mar,
em jeito de conflito titânico,
e as achas juntaram-se às centelhas
e a luz tornou-se constante.
a vida – no processo do nascimento.
o nascimento – feito explosão da luz rasgada
da letra desenhada na areia do que viria a ser praia;
sem querer – tornando-se ser – foi o brilho dos olhos que
em primeiro lugar surgiu – e a palavra tornou-se complexa
conforme as emoções desenhavam a actual geografia
de serras e ciclos de água torrentes. a Terra –
as achas do momento acharam-se
no Mundo, eterno e flácido
estavas lá quando tudo se tornou nada
ou apenas saíste do nada para te tornares a metáfora
do nascimento e do apagar da escuridão?
?
da interrogação fez-se o poema.


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

inveterados

em 88, quando a chuva era quente, matei-te e não te queixaste, e o mundo era só harmonia
as etiquetas das camisolas e camisetas faziam-te comichão nas costas, hoje não existem ou são apenas pedaços sintéticos de algodão nostálgico que não provoca a comichão do passado

em 87, ainda não te tinha matado, e o mundo estava na mesma em harmonia. o muro de berlim estava à espera da tua morte, e o roger waters à espera da sua queda.
os locais presentes no passado da tua memória, catapultam-se o que torto se endireita, e as balas batem contra a boca que tenta berrar o que não deve ser pronunciado, matei-te e não te preocupaste com nada, nem eu

em 86, as opções seriam bem mais reduzidas, o michael jackson já estava mais que preparado para partilhar com o mundo uma lição que já o isaltino nos ensinou - eu tentei não ser mais preto mas podia ser só uma doença de pele - anyway, eu fiz videoclips de apoio aos que ainda são pretos e com orgulho, e aos animais

em 85, o ano era demasiado redondo para me lembrar de nós, e o sol não gostava muito da rússia. estavas loira e o tempo não focava bem os contrastes das sobrancelhas negras.

o local do nosso encontro é o mesmo, e não razão para guardar rancor. eu matei-te e ainda respiras à espera que te mate em 84

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

irrita-me a sonolência dos dias, o mau estar e a incerteza... irrita-me o pensamento ligado por cerca de 20horas num dia de 24h e o voltar da sonolências dias mas pela noite
irrita-me a agenda e o pensamento humano, irritam-me as contextualizações e conservadorismos fascistas da estética e da hierarquia da composição textual
irritam-me as dores e o não saber porque é que as coisas se degradam com o tempo e se tornam irreversíveis... irrita-me perder luz quando a sonolência dos dias se revela escura

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

...olhar e ver...

...não me olhes assim que não me vês, antes come o meu interior!...
...come o meu fígado estufado e o coração guisado!... come também os pulmões com salada de agriões!... come tudo!... faz linguiças com as tripas!... raspa bem toda a massa visceral e não tenhas pudor... tempera com pimentão a gosto, não te levarei a mal... come-me com os dedos, com a boca e os dentes!... estilhaça-me a carne encarnada e não deixes nada!... leva tudo, esmaga tudo!... tritura tudo em matéria viscosa, oleosa... faz hamburguers, almôndegas, sei lá!... vende-me por vaca ou porco, é igual... dá-me como comida aos cães se me faltar sal!... e deixa-me a carne apodrecer se ainda não me conseguires ver, tanto faz... que a comam os bichos então!... que os vermes façam dela o seu festim celestial! o seu banquete orgiástico!...

sábado, 7 de janeiro de 2012

“corpos, meros vasos”

...é na poesia que esquartejo o meu corpo, dedo por dedo, perna por perna, braço por braço... depois todo o interior visceral até nada mais restar do meu corpo... até ao mero receptáculo vazio... destruo órgão por órgão na atitude mais contemplativa do belo... esvazio tudo em mim para que do nada renasça parte de mim outra vez, e destruo-me ainda com mais certezas... com o maior fulgor das bestas esmago cada pedaço do que sou à poça de sangue no chão de pedra... A pedra quente do sangue na noite fria de um adeus... ainda quente do sol que a aquecia... a pedra fria na noite gélida tremia o corpo... o corpo vazio morria a cada por do sol e eu, sem sangue nas veias a correr, preso ao corpo oco, já nem sentia; nada sentia de meu... e não sei como, mas a pedra aquecia o corpo vazio de mim... a pedra guardava ainda o calor do meu sangue... os corpos, vasos que guardam as noites e os dias... receptáculos da ilusão... marmitas do tempo... desapareceram, transformaram-se em pedra... mas pedra quente de sangue! Pedra quente do sangue derramado... pedra quente de mim...
o caminho era feito de pedra. consigo lembrar-me do cheiro da pedra em contacto com a chuva que nela bate vinda do céu. gostava de me lembrar do teu cheiro daqui por 4 anos, mas preciso desse tempo para me esquecer do cheiro. as rochas não tinham lugar onde a pedra do caminho trilhava os corpos. e os corpos eram meros vasos onde a pedra depositava o suor e a humidade dos séculos de caminho vão. queria tanto saber onde encontrar a luz dos teus olhos para secar a chuva nesta pedra, mas preciso dos olhos para não cair em falso.
entering the sistem já não vejo onde dar mais um passo, e não sei onde pousar o pé esquerdo failed parece-me que ainda sei como chegar a pé a tua casa. as pedras redondas e mal dispostas na calçada - prenúncio de um castelo de sonhos please press the reset button for five seconds o caminho ainda é feito de pedra. e eu consigo ainda lembrar-me do cheiro, e ainda sei como olhava para ambos os lados às duas da manhã com a rua deserta then press the on button and click DEL before entering the sistem again
volta de lá. mas fica por aqui.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

... uma pedra no meu caminho, nela me quedei... matéria bruta mas cedosamente lisa como mármore... por ela deixei meu corpo escorregar... numa descida vertiginosa, não, talvez numa subida sem gravidade... o que interessam as direcções?... na velocidade quase imparável do movimento último, na eminência atroz do cair do véu – o rosto sem rosto, carne do mundo-, eu acordo; ou o mundo gira e volto a ter gravidade, a gravidade da pedra... Mas ainda o meu sol aquece o frio do mármore!... sim, e na pedra quente derrete-se a carne e falam as almas... Há homens que recorrem ao último suspiro para falar da sua verdade... eu não, a pedra lisa, misteriosa e bela parava o meu tempo... o tempo sem tempo parado no movimento em que o meu corpo perdido na pedra estava... no seu espaço, sem coordenadas possíveis... sem opção no mundo das opções!... perdido, não à procura mas loucamente perdido... posso não ter razão, nem sequer fazer sentido... nem interessa... a pedra arrefece sempre que o sol se põe, e o meu corpo volta a deslizar por sobre a superfície da pedra lisa, gélida, e toda a carne desimpedida permite agora que a pedra faça a sua viagem: os ossos quebram-se lentamente, os tendões paralisam, os músculos rebentam numa explosão sanguinária, as veias soltas tingem de vermelho o mármore e retribuem-lhe o calor, e o calor perdido regressa à pedra... e desfeito sobre a pedra, o meu corpo renasce a cada nascer do sol...
olhos inadequados
incoerentes, desajeitados
indignados e sem retina