quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

o deserto

- Sou um corpo parado olhando, absorto, o deserto! dizia ele
eu não dizia nada. Ainda nada me rebentava nas mãos.
Era meio-dia. O sol queimava nos cabelos uma chama nova.
Caiam gotas gordas e frias sobre as costas ardendo,
caiam como caem os corpos de Homens maduros
violentamente...
corpos intactos e maduros de Homens caindo de algumas árvores.
era meio-dia.
Entravam rápidas nas costas,
acendiam por dentro os esconderijos, rebentavam
a sua luz nas hortas menos propensas.
Ele estava parado, absorto
partindo em pequenas porções para dentro das coisas do deserto.
- Sou um corpo parado, loucamente parado. dizia.
As coisas caiam-lhe nas costas vermelhas
entravam, como Homens maduros, violentos
caindo das árvores para dentro das costas. parecia doer.
Eu não dizia nada. e já nas mãos
cresciam sistemas, coisas do deserto complicando-se.
Entravam muito frias. ardia. fazia rir.
- Sou um corpo loucamente parado, complicando o deserto. dizia.
corpos inteiros caindo de árvores inteiras
duros por fora, com casca, caindo...
entrando, rebentando nos esconderijos a sua luz prometida,
iluminando as costas. uma chama nova.
Eu não dizia nada. e já tudo saia de mim, violentamente
contra as coisas do deserto. era meio-dia.
- Sou um corpo complicado, loucamente parado. Sou o deserto! dizia ele.
o deserto nada dizia.

                                                                                                               (Nuno M.-V. Tavira: Jan/2014)

3 comentários:

  1. (mísera homenagem ao mestre que não podemos ter porque "juizinho é que preciso" e porque os legumes são alimentos ricos em nutrientes para o nosso corpo crescer forte e saudável, e não são coisas que crescem e rebentam por dentro das pedras translúcidas que nos caem das asas para dentro da nuca. Os pimentos não podem ser o teu xamã, não têm luz... dizem.)

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  2. Outro meio-dia, o mesmo...
    ...E as cebolas que nos fazem rir loucamente com seu ácido ardente e tresloucado.
    O deserto ainda lá está: sereno, observando os homens maduros, esquartejados, perfurados, mas intactos...
    Novamente meio-dia, o mesmo...
    As árvores, o deserto, o silêncio, a violência, a dor...
    Meio-dia.

    (Compadre, foi o comentário mais contextualizado que consegui, embora só tu detenhas o significado de tais palavras, já sabes que não vou muito com legumes).

    Forte abração!!!

    Marco Aurélio Mangas

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  3. «O desenho a fogo: os dedos e o sopro.
    As pedras soltas suscitam algo,
    uma textura sem segredo, aberta.
    Como se não procurasse olho: sempre o deserto?

    O corpo e essa onda, essa pedra – é uma linha
    e o tumulto dos músculos no mar
    eis o desejo da perda e do encontro
    contra a parede, contra esta página
    este deserto – o mar.»


    arr, as marcas no deserto


    ...

    lindo companheiro,
    absolutamente genial

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