terça-feira, 21 de maio de 2013

poema de comboio #19


garagem
desvio para Tires, à direita
mais tarde… para o lado adverso
a avenida 1º Dezembro
mais pequena que uma artéria perpendicular
“até amanhã!”
que simpatia a do motorista

stop!
al berto, onde estás?
porque é que compramos as obras
se não cabem na mala?

464
estou perto de chegar a casa
até quando for casa
até quando houver estrada
passamos nas passadeiras
à mesma velocidade que tu
e tu não cabes na mala também…

agente de fidelidade…
algo me soa tão traiçoeiro
no teu letreiro branco
o viaduto
a garagem ao lado do viaduto
e da rotunda

pedra
esgotos
saídas de água
desvios para Tires
que engano o nosso?
este, aqui no lado adverso.


4 comentários:

  1. Encontrarão sempre saída, e há sempre espaço para o que encontrares na descrição de algo... Circunda na oblíqua perpendicular, a saída está mesmo debaixo dos teus pés... Abraço

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  2. Gosto muito deste pequeno "poema" pois parece que consegui simultaneamente uma ideia de caminho de autocarro (com entradas e saídas de pessoas pelas paragens) (com paisagens distintas ao longo do caminho) (com a solidão do pensamento no meio de tanta gente, daquele observa), como uma ideia final que acaba em perfeita desconstrução ou infinitude do caminho... que engano o nosso? (parece uma pergunta, mas não acredito que seja)... aqui no lado adverso.
    Obrigado Marco!

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  3. Reflectindo um pouco, notamos uma evolução. Estes poemas, primeiro que tudo, expõem e picotam - picotar, essencialmente, é fazer sobressair - um voyeur. Mas neste caso não um voyeur das coisas e actos da vida extra-si, mas sim um voyeur do movimento, da trajectória - do rumo migratório - intra-si. A descrição erguida no poema não (me) chega para provocar enargueia. O que me leva a concluir - para os efeitos que a mim se me aportam - que esses viadutos, essas garagens, esses comboios, esses ferros e linhas, não são coisas palpáveis. Ou, reformulando, são cada um deles um apeadeiro de um caminho onde nunca se está verdadeiramente, ainda que de lá nunca se tenha saído. Eu não vejo estes elementos - os atrás referidos - através do poema. Nem os quero ver. Basicamente, colocas Baudelaire a bater um papo, regado a vinho, com Platão... enquanto o Al Berto - porquanto não salvaguardou as questões estéticas e utilitárias do objecto - é extraído da conversa. Esse sim, eu vejo. Não vejo apenas, sinto o peso. Talvez seja este, verdadeiramente, o único elemento - no sentido de objecto, partícula coisificada - do texto exterior em toda a interioridade. Concluo (re)citando - e adaptando ao caso - umas linhas escritas [vd. "Travessias"] para as pinturas da Fátima S. Franco: "Esta viagem não existe, porquanto pré-figuração do inalcançável". Ou melhor, existe na sua impossibilidade de existir... afirma-se na sua auto-negação.
    Abraço enorme! Boas leituras, boas leituras, boas leituras, boas lechugas, boas escritas...

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  4. Será também possível acreditar que todas as paragens e apiadeiros do poema, dos poemas de comboio, estão apenas ao alcance do momento... da linha... do verso... e não figuram mais que o próprio momento.
    Muito obrigado pelo comentário. Servirá de bastante para o lume do comboio ainda a vapor.

    Abraços!

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